23/05/08

Dame de voyage

O que leva um homem a procurar uma substituta artificial para o seu consolo íntimo? A falta de um consolo natural, obviamente. O mais velho proxy do mundo, a esse nível, é a mão. O polegar oponente teve outras aplicações que o bom criador estava longe de imaginar (ou talvez não) para além de lascar sílex. Outros necessitados e subnutridos sexuais chegam a usar o cú que estiver mais à mão, mesmo que seja de gajo embarcado ou enclausurado no mesmo inferno. Outros ainda, no rigor da montanha, escolhem a bicheza para o saque. Não há quem pare esta pulsão.

Fora do campo do natural, surgiu o conceito de "dame de voyage". Claro que foram os franceses a cunhar o conceito, esses mestres do promíscuo. Assim, antes do aparecimento industrial do vinil, seriam os marinheiros mais avessos a mariquices que levariam bonecas de trapos para o seu alívio: as tais "dames de voyage". Anos mais tarde surgem as clássicas insufláveis. Uma concessão à portabilidade e ao envio por via postal. Mas, a julgar pela net, o mundo das Sex Dolls é isso mesmo: um mundo. As bonecas beneficiam das sofisticações tecnológicas a nível dos materiais e fazem lembrar raparigas de olhar perdido. Estas Real Dolls podem chegar aos 7000 USD. São feitas de silicone e outros materiais que lhes emprestam um realismo nunca imaginado pelos pobres marinheiros de antigamente. Os japoneses têm também a sua linha de produção. Para os mais exigentes, existem mesmo modelos de animais. Pode ser para regalar o boby, ou talvez não.

Mas a terceira e verdadeiramente interessante geração destas silenciosas e fiéis companhias está para chegar. David Levy é um investigador holandês em inteligência artificial e propõe a parceira (ou o parceiro) robot. Diz mesmo que no futuro as pessoas se poderão casar com robots. Na verdade, qual será o limite? Mas esse é um assunto para desenvolver num próximo post.

16/05/08

Leitura semiótica - ensaio


Esta é, como muitas outras, uma imagem com complexos caminhos de enunciação.
Deixo aqui a minha leitura - naturalmente fugaz e, portanto, incompleta.
Factos:
O espaço - um salão automóvel;
O momento - um casal abandona um grupo de observadores de um qualquer objecto motorizado, quando o jovem macho sente o seu olhar atraído para sítio outro que não o caminho.
O que se pode dizer:
Tratar-se-á de uma salão de Tunning - nos salões mais generalistas haverá mais investimento em alcatifas e aquela senhora da esquerda, com o blusão dourado, não estaria em nenhum stand a entregar folhetos.
Pela expressão de ambos parece perceber-se alguma tensão prévia ao momento do olhar desviado; talvez ela tenha ido contrariada, talvez ele lhe tenha respondido, no final de umas tantas insistências, "Pronto, pronto, vamos lá ao Shopping!"
Nesse ambiente de perturbação emocional, o jovem parece, instintivamente, procurar o conforto das grandes certezas (sabia que ainda havia, um dia, de aqui afinfar uma frase qualquer do António de Santa Comba!) - fá-lo (do verbo 'fazer') num universo que, afinal de contas, percebe como acolhedor, simpático, disponível, adaptável ao seu corpo e aos seus segredos - o dos estofos personalizados.
A jovem, obviamente, não percebe.
Achará - ó ignara figura! - que ele só se pôs a olhar para as pernas das gajas. Achará - ó mente retorcida! - que ele mais do que olhar para cú alheio se pôs a pensar algo do género - "Como é que eu vim parar a este lugar e como é que tenho esta aqui ao meu lado?".
Há, nele, uma pose de temperada resignação; as mãos que se cruzam, o olhar descansado no gasto tapete vermelho. Sabe que nunca vai conseguir explicar-lhe o que aconteceu e sabe que nunca vai poder explicar-lhe porque aconteceu. Sabe também que não vai conseguir ouvir 'aquele' CD na viagem de regresso a casa e que, mesmo depois de aumentar subtilmente o volume do rádio, a mensagem não passará. Sabe que vai ouvir hoje, amanhã e, possivelmente, em muitos dias de um futuro incerto, referências distorcidas ao episódio.
E sabe tudo isto com mais certeza do que saberá porque as vai continuando a ouvir.
Esta é uma história triste que prova como as acareações entre homens e mulheres não funcionam - são de cores diferentes os mundos em que vivem.

06/05/08

02/05/08

"Não tenho roupa nenhuma!"

(Salvaguardando raríssississimas excepções) As fêmeas são um nadinha mais dadas a expedições em lojas de roupa do que os homens.
Há todo um ritual em torno do processo que o torna bem mais complexo do que a simples aquisição de meteriais têxteis para cobrir o corpo. Aliás, em muitas ocasiões, tal desiderato não chega sequer a ser cumprido - "voltamos cá depois!", dizem, como se isso fosse tão natural.
E é. Para elas é.

A expedição não é, como acontece com os machos, um empreendimento com objectivo expresso; começa com um "preciso de umas calças pretas" e pode - como se disse - muito bem terminar sem elas mas com um topezinho laranja ("de que precisava muito para combinar com aquelas calças"...never mind, never mind!...), umas sandálias em cunha (" a não-sei-quantos tem umas e diz que dão um andar fantástico"), ou uma (quase inevitável) mala, matelão, maletinha, saco, ou sacola ("é para a praia - dá-me jeito").
Há uma lógica interna ao processo que parece ter sido desenvolvida para nos escapar por completo.
O homem será, em tudo isto, pouco mais do que instrumento de carga (e é vê-los, aos molhos, nos centros comerciais por esse país fora, à porta das lojas, com uma série de sacos de plástico numa mão, a outra no bolso e o olhar transfigurado de quem, naquele momento, tem uma existência ausente) e, por vezes, caixa de ressonância para - e isto é muito importante! - APROVAÇÃO das opções em curso.
Nada mais.
Há os que aguentam.
Há os que já encontraram formas de lidar com a coisa da maneira menos desagradável possível - "Vai, vai...eu estou ali na FNAC").
E há os outros...geralmente novos, quase imberbes, líricos - os que acham que vão conseguir explicar-lhes que a compra de roupa pode ser uma actividade racional.
Esses, coitados, esão destinados a encher os consultórios médicos de especialistas em inflamações do aparelho gástrico.
Os outros - os que, de uma maneira ou outra lá se aguentam - só ocasionalmente perdem a compostura. Só em momentos raros, quando em dias que já corriam mal ouvem a popular frase: "Não tenho roupa nenhuma para vestir!".

01/05/08

Colecionismo

Sempre fiquei perplexo com a razão que leva homens feitos a gastar horas a separar selos do Sri Lanka com papagaios e tucanos ou das ex-colónias com pretinhos de sorrisos e calções demasiado brancos. As colecções intrigam-me. E há. Há muitas.

É notório, numa curta conversa com um colecionador crónico, que a colecção é algo estimulante e com alto poder de dependência. No colecionador, nota-se uma certa aceleração do envelhecimento e por vezes profundos danos cerebrais irreversíveis, entre outros problemas de saúde. Ou seja, a colecção é uma espécie de trip de heroína, ou candidatura à presidência do PSD, mas com efeitos secundários mais leves.

Todos nós colecionamos, de uma maneira ou de outra. Todos nós temos os nossos selos com tucanos que nos impedem de pensar noutras colecções.

Eu colecções...só revistas...




Só trabalho, só trabalho...

Se até o Poderoso descansou...